Preparar uma (meia) maratona:
5 passos essenciais.
Corta a meta forte e sem lesões com uma preparação inteligente e baseada em dados.
Mais do que acumular quilómetros
Preparar uma meia maratona é uma jornada que exige estratégia, consciência corporal e uma abordagem que respeite a individualidade de cada corredor.
Muitos corredores cometem o erro de pensar que basta aumentar gradualmente a distância das corridas.
Uma preparação eficaz envolve múltiplas variáveis: treino cardiovascular estruturado, treino de força individualizado, nutrição adequada, recuperação inteligente e gestão mental da prova.
Neste artigo, exploramos os 5 passos essenciais que fazem a diferença entre chegar à meta esgotado (ou lesionado) e cortar a meta forte, confiante e pronto para celebrar.
Um plano bem estruturado alterna entre diferentes intensidades ao longo da semana, respeitando o princípio da sobrecarga progressiva: aumenta gradualmente o stress, mas dá tempo ao corpo para se adaptar. Tipicamente, 80% do volume deve ser feito em zonas fáceis, e apenas 20% em zonas de maior intensidade.
Corridas fáceis a ritmos baixos: Estas são a base da sua preparação. Correr a um ritmo conversacional (consegue falar em frases completas) desenvolve a sua capacidade aeróbica, ensina o corpo a usar gordura como combustível e permite recuperação ativa entre treinos mais intensos.
Corridas longas: Progressivamente mais longas, estas sessões preparam o corpo e a mente para a distância da prova.
Treinos intervalados: Séries de distâncias mais curtas (400m-1600m) a ritmos mais altos, com recuperação entre cada série. Estes treinos melhoram a sua velocidade máxima e economia de corrida.
Treinos de ritmo (tempo runs): Corridas a um ritmo ligeiramente mais rápido que o objetivo da prova, mantidas por 20-40 minutos. Ensinam o corpo a sustentar um ritmo desconfortável.
Para treinar nas zonas certas de intensidade, pode realizar uma análise de gases e/ou lactato ou testes de zonas cardíacas/VO2 max. Estes testes fornecem dados objetivos sobre:
- Os seus limiares aeróbico e anaeróbico
- A que ritmo/frequência cardíaca treinar em cada zona
- Qual o seu ritmo sustentável para a prova
- Como o seu corpo utiliza diferentes substratos energéticos
O mais importante: ter quem interprete esses dados e os traduza num plano de treino adequado ao seu nível atual, aos seus objetivos e à sua disponibilidade.
Cada indivíduo corre de forma única. A forma como cada um absorve o impacto, se propulsiona para a frente, estabiliza o tronco e controla o movimento dos membros inferiores é diferente de pessoa para pessoa. E essas diferenças determinam:
- Quais os grupos musculares que precisam de mais força;
- Que padrões de movimento necessitam de ser melhorados;
- Onde existem assimetrias que podem levar a lesões;
- Que exercícios terão maior transferência para a sua corrida.
O treino de força bem prescrito deve ter transferência direta para a sua técnica de corrida, de forma a torná-la mais económica e deixá-lo menos cansado.
Alguns exemplos do que um programa de força para corredores de meia maratona deve incluir:
- Força reativa/pliometria: melhora a rigidez reativa dos tendões, que permite armazenar e devolver energia elástica de forma mais eficiente;
- Força: dominante das ancas ou dos joelhos (dependendo do perfil do corredor) melhora a propulsão e reduz a sobrecarga articular;
- Potência: melhoram a capacidade de produzir força rapidamente — essencial para passar da fase de absorção de impacto para a propulsão;
- Estabilidade: reduzir oscilações do tronco que "roubam" energia ao movimento para a frente.
- Exercícios correctivos baseados na sua avaliação individual.
A frequência ideal? 2-3 sessões por semana, integradas estrategicamente no plano de treino de corrida.
Pode fazer uma avaliação biomecânica da corrida, que analisa objetivamente:
- A sua técnica de corrida em diferentes fases do movimento;
- A forma como o seu corpo absorve o impacto a cada passada;
- A forma como se propulsiona para a frente (eficiência e simetria propulsiva)
- Estabilidade e coordenatação do tronco e da pélvis durante a corrida;
- Simetria entre os membros inferiores;
- Fatores de risco de lesão específicos
- Amplitudes articulares e coordenação neuromuscular
O corpo humano tem reservas limitadas de glicogénio (a forma de armazenamento de hidratos de carbono), e uma meia maratona pode esgotar essas reservas.
Cada corredor tem necessidades diferentes, baseadas no seu peso, ritmo de corrida, eficiência metabólica e até na temperatura ambiente. O que funciona para o corredor ao seu lado pode não funcionar para si.
Antes da prova — nos 2-3 dias anteriores: Aumente ligeiramente a ingestão de hidratos de carbono (carb-loading moderado) mantendo volume de treino baixo.
Refeição pré-prova — 2-3h antes: Hidratos de carbono de fácil digestão, baixo teor de fibra e gordura.
30-60 min antes: Pequeno snack se sentir necessidade (gel energético, banana) e hidratação.
Durante a corrida:
- Hidratação: Para a maioria dos corredores, 150-250ml de água a cada 20 minutos é suficiente. Em dias quentes, pode precisar de mais e incluir eletrólitos (sódio especialmente).
- Hidratos de carbono: Para corridas acima de 60-75 minutos, o corpo beneficia de ingestão de hidratos durante o esforço. Objetivo: 30-60g por hora, dependendo da intensidade e tolerância individual.
- Fontes práticas: Géis energéticos (mais concentrados), bebidas isotónicas (hidratação + energia), gomas/mastigáveis, ou alimentos reais se o estômago tolerar.
Teste a sua estratégia nos treinos!
Esta é a regra de ouro: nunca tente nada novo no dia da prova. Use as corridas longas para experimentar:
- Que tipos de géis/produtos tolera melhor
- De quanto em quanto tempo precisa de se alimentar
- Quanto líquido precisa em diferentes condições
- Como o seu estômago reage a diferentes alimentos
O que funciona em repouso pode causar desconforto gastrointestinal em esforço. Eduque o seu sistema digestivo durante os treinos.
- Fadiga desproporcional nas corridas longas
- Tonturas ou confusão mental no final de treinos longos
- Desconforto gastrointestinal recorrente
- Dificuldade em manter o ritmo após 12-15 km
- Recuperação muito lenta entre treinos
O treino é o estímulo, mas a adaptação acontece quando recuperamos.
Preparar uma meia maratona é uma sobrecarga significativa para o corpo. Sem recuperação adequada, entra num estado de fadiga cumulativa que:
- Aumenta drasticamente o risco de lesões
- Diminui o sistema imunitário (mais constipações e infeções)
- Reduz a qualidade dos treinos (não consegue treinar nas intensidades prescritas)
- Compromete as adaptações cardiovasculares e musculares
- Pode levar a overtraining e burnout
Lembre-se: descanso não é preguiça, é treino inteligente. Os corredores mais bem-sucedidos não são necessariamente os que treinam mais, mas os que equilibram melhor treino e recuperação.
1. Sono de qualidade (7-9 horas por noite)
Durante o sono profundo ocorrem processos fundamentais:
- Libertação de hormona do crescimento (reparação muscular)
- Consolidação de padrões motores aprendidos nos treinos
- Restauração do sistema nervoso central
- Regulação de hormonas do apetite e metabolismo
2. Semanas de descarga (deload weeks)
A cada 3-4 semanas de treino progressivo, inclua uma semana com volume reduzido (30-40% menos) mantendo alguma intensidade. Isto permite:
- Supercompensação: o corpo "absorve" o treino acumulado
- Redução de microtraumatismos antes que se tornem lesões
- Recuperação mental e motivacional
- Preparação para novo bloco de treino mais exigente
3. Dias de descanso completo
Pelo menos 1-2 dias por semana sem treino estruturado. Isto não significa ser sedentário — caminhadas leves, yoga suave ou mobilidade são benéficos. Mas sem corrida ou treino de força.
4. Estratégias de recuperação ativa:
Nutrição adequada;
Alongamentos e mobilidade;
Massagem desportiva;
Gestão de stress.
- Frequência cardíaca em repouso elevada (5-10 bpm acima do normal)
- Dificuldade em atingir zonas de frequência cardíaca altas nos treinos
- Dores musculares que não melhoram com 48-72h
- Irritabilidade, dificuldade de concentração, falta de motivação
- Insónias ou sono não reparador
- Quedas inexplicáveis no desempenho
- Maior suscetibilidade a doenças
Se identificar 3 ou mais destes sinais, considere adicionar dias de descanso ou reduzir o volume/intensidade.
Durante os treinos longos, pratique estratégias mentais que vai usar na prova:
Chunking (dividir em partes)
Em vez de pensar "ainda faltam 15 km", pense "vou até ao próximo quilómetro" ou "mais 10 minutos neste ritmo".
Diálogo interno positivo: Substitua "não aguento mais" por "já consegui treinos mais difíceis" ou "o meu corpo sabe fazer isto".
Âncoras atencionais: Quando a mente vagueia para o desconforto, redirecione a atenção: conte passadas, foque na respiração, observe a paisagem.
Visualização: Nas semanas antes da prova, visualize-se a correr forte, a ultrapassar momentos difíceis, a cruzar a meta.
Por fim, lembre-se: vai haver momentos difíceis. É garantido. Entre o km 12-17, provavelmente vai querer desistir. Esse é o momento de aplicar tudo o que treinou mentalmente. O desconforto é temporário, mas a satisfação de terminar a prova dura para sempre.
Crie um documento (ou cartão que leva na corrida) com:
Ritmos objetivo por secção: Ritmo conservador (primeiros km), ritmo objetivo (meio), ritmo de resguardo (se as coisas correrem mal).
Pontos de alimentação: Quando e o que vai ingerir. Onde estão os postos de abastecimento.
Marcos psicológicos: "Aos 10 km, já vai a meio. Aos 15 km, só faltam 6 km — uma corrida curta".
Mantras para momentos difíceis: 2-3 frases que o motivam quando a mente fraqueja.
Plano B: O que fazer se começar demasiado rápido, se sentir cãibras, se o dia estiver mais quente que esperado.

Conclusão
Preparar uma meia maratona é uma jornada que exige estratégia, consciência corporal e uma abordagem que respeite a individualidade de cada corredor.
Muitos corredores cometem o erro de pensar que basta aumentar gradualmente a distância das corridas.
Uma preparação eficaz envolve múltiplas variáveis: treino cardiovascular estruturado, treino de força individualizado, nutrição adequada, recuperação inteligente e gestão mental da prova.
